quarta-feira, 13 de abril de 2011

Perdão.

(Sempre tive dificuldade em compreender o dom do perdão. E mais do que isso, nunca consegui compreender a maldição do esquecimento. Intriga-me particularmente a capacidade de aparente absolvição de todos os pecados do comum dos mortais…)

Eu também perdoo, sim. Mas é difícil! Não consigo limpar todas as manchas de sangue que respingaram a minha memória. E muito menos fingir que nem nunca me sujaram. Não é água que evapora, é sangue que se entrenha. Tu não - tu consegues tirar crostas sem jorrar sangue, tu não tens cicatrizes mal saradas. E eu não – eu continuo a sentir cada gota, eu tenho medo de olhar para as cicatrizes. Como se apenas o olhar queimasse…

Como foste capaz de me apagar, como se nunca tivesse escrito uma pauta de intimidades, ou pintado um quadro em tons de felicidade ou até mesmo existido nesta simples forma de gente? Como esqueceste os suaves e doces pesadelos? Como consegues dormir todas as noites sem sequer olhar para trás? Sinceramente…não te lembras? Não te lembras de nada?

Sempre que tenho a infelicidade de me cruzar com a minha sombra, sou invadida por memórias absolutamente devastadoras, como se estivessem cosidas na minha pele. Sim, tento mantê-las no pequeno baú, lá no sótão. Mas sempre que passo por aquelas escadas, não consigo… não imaginas quantas vezes, não poderias! Não conseguirias, porque és o mestre do esquecimento.

Como consegues andar sem te deparares com o Passado? Quem sou eu para ti, sem nada do que sou? Nunca paraste, nem por um bocadinho? Como consegues olhar para mim sem sentires absolutamente nada? O que sou eu neste Presente, já que me tiraste todo o Passado? Nunca mais te lembraste de tudo o que não fui? Depois de tudo o que fui, de tudo o que fiz…tu esqueceste. Esqueceste-me. Quem esperas que seja no Futuro, se esqueceres também quem agora sou?

Não creio que me tenhas perdoado, não quero crer que me esqueceste. Não sei o que fizeste, mas sei que não és quem foste. Não somos o que fomos, bem sei. Não quero esquecer, porque é o que ainda sou. Mas quero perdoar, quero conseguir sonhar novamente.
Quero absolvição de mim mesma, quero que me recordes. Quero guardar-te, quero pedir-te para me ires buscar onde me deixaste abandonada. Quero cortar os fios que me prendem, quero que sejas feliz.

E eu, pequena escrava das estrelas, não consigo esquecer… Por que não te lembras?

1 comentário:

  1. Enfim perdoar faz parte, apenas creio que se pode perdoar quando após o sangue respingado se derrama água limpa, pois de outra forma algo é quase impossivel a não ser que usemos o grande amigo tempo para lavar com a sua erosão dolorosa e lentamente ardente, apenas penso que o nosso passado pouco influencia o presente, o presente neste momento rege-se por leis próprias que eu próprio não consigo compreender a apenas penso, porque será que algo assim acontece, será que tem a ver com a priorização? ou será que são demasiadas perdas para umas consciência apenas aguentar, sinceramente não sei mas chegamos perto do "crack point", e quando lá chegar espero estar tombado para o lado certo

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